quarta-feira, 25 de julho de 2012


Por que me odeio



Eu me odeio pela minha covardia,

Pela minha normalidade,

Por minha aparência saudável,

Por minha existência pifiamente linear,



Eu me odeio por não embarcar na minha própria viagem, que mesmo que fosse sem volta, ainda assim faria com que me deslocasse.



Eu me odeio pelo apetite diário que sinto,

Por salivar diante de um prato de comida.

Odeio respirar tão calmamente, sem a sofreguidão que a alucinação pode permitir.

Eu me odeio por não me permitir.



Odeio a claridade que me cega e a nitidez que embasa meus sentidos

Eu odeio entender o que poderia me ser oculto e ocultar aquilo que entendo.

Eu me odeio pelo odor de segurança que exalo, pela saturação, pela acomodação.

Eu me odeio pelo acorde plácido que produzo, porque não sei desafinar.

Eu me odeio por aqueles que escolhi  me rodearem,

Pelas suas ignorâncias que nada mais são que uma extensão de minha própria imbecilidade.



Eu me odeio por ter voltado do transe,

Por ter abrido os olhos,

Por minha língua ter se desenrolado e tornado a se enrolar na linguagem desprezível do esperado.

Eu me odeio por esperar, por voltar de onde nunca deveria ter saído.

Eu me odeio por ter existido, quando na verdade, jamais existi de fato.



Eu me odeio por não ser invisível.

Eu odeio o cartão de natal, a festa de aniversário, eu odeio os óculos que me obrigaram a usar.

Eu me odeio pelas lentes duplicadas que reduplicaram minhas dores.

Eu me odeio, pois meus lábios sempre foram mais lentos que meu pensamento.  Por que quando minha língua desenrolou, minha mediocridade se tornou visível.

Eu me odeio por ter sido diferente quando deveria ter sido igual, e de ter feito igual quando poderia ter feito diferente.

Eu me odeio por pensar que não penso. Eu me odeio pelo pronome oblíquo que torna meu mundo estreito e restringe quem eu seria. Eu odeio o verbo com ideia de ação inacabada, pois ele sugere que minha dor será eterna.

Eu me odeio por seguir caminhos e não encurtar minha trajetória encontrando um atalho de desvario.

Eu me odeio pelo bom-senso, pela falta de mim nas tarefas cotidianas.

Eu me odeio pela maquinaria que represento, pela engrenagem da qual sou parte.

Eu me odeio por não conseguir pulverizar minha essência, por não ter competência.

Por isso me odeio. Eu me odeio.


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